CARTA DOS ADVOGADOS CRIMINALISTAS - 01/10/2013
CARTA DOS ADVOGADOS CRIMINALISTAS BRASILEIROS À NAÇÃO
Os advogados criminalistas do Brasil, reunidos no seu VI Encontro Nacional, realizado
nos dias 26 e 27 de setembro de 2013, na cidade de Curitiba, Estado do Paraná, a
pós longa reflexão e intensos debates sobre as liberdades individuais, garantias processuais penais
de índole constitucional do cidadão e a persecução penal no Estado Democrático de Direito,
deliberaram proclamar à Nação que:
1. A Constituição da República Federativa do Brasil, concebida e gestada em ambiência
plenamente democrática e promulgada por legítima fonte de poder, estratifica a soberana vontade do povo brasileiro e não
pode ser interpretada de modo a negar seus postulados fundamentais nem seus princípios perenes a pretexto de se
atenderem supostos “anseios das ruas” ou conveniências de ocasião. Tem ela a vocação da permanência e sua
modificação, no que possível, só pode ocorrer por meio do devido processo legislativo, é dizer, através das emendas constitucionais;
2. As garantias de natureza processual penal positivadas em preceitos e princípios da Carta Magna são intocáveis
posto que resultantes de refletida e dolorosa elaboração político-institucional, não se mostrando admissível - antes, é intolerável – sua negação,
mortificação ou restrição por via da interpretação pretoriana intencionalmente direcionada contra seu espírito;
3. Não se admite no nosso sistema democrático a triste figura do “juiz justiceiro” que, despindo-se da imparcialidade e abdicando da necessária equidistância das partes, se transforma em algoz dos acusados e, sem rebuços, prestigia a hipertrofia dos expedientes acusatórios
que compromete a paridade de armas (par conditio), apanágio da dialética processual democrática e fator de legitimação
da persecução estatal;
4. As deficiências do Poder Judiciário do Brasil, máxime sua proverbial morosidade, não são devidas à atividade
desenvolvida pela defesa técnica dos réus, que é imposição constitucional, nem pelas oportunidades de impugnação de ilegalidades e manejo de
recursos postos à sua disposição pela lei. Antes, a lentidão se deve às carências estruturais que exibe,
seu peculiar regime de trabalho e à tenaz resistência que sempre ofereceu - e segue oferecendo – à ampliação de seus tribunais. Assim é que a
criação de novos órgãos jurisdicionais sempre enfrentou veemente oposição da
própria magistratura brasileira ao argumento de que “não se deve vulgarizar cargos e funções judicantes”,
como se a Justiça existisse para os magistrados e não para o povo.
Em um país com mais de duzentos milhões de jurisdicionados, os tribunais e os juízes
existentes são insuficientes para atender à demanda de justiça contida;
5. Repudiam, com toda ênfase, o fenômeno indesejável do “autoritarismo judiciário”
que, em postura retrógrada e condenável, insiste em limitar o espectro do mais
democrático, eficaz e ágil instrumento de defesa da liberdade humana contra abusos e
ilegalidades que é o Habeas Corpus. Essa percepção restritiva, autoritária e
antidemocrática substitui nos dias de hoje o arbítrio outrora posto em prática por
déspotas, tiranos e autocratas, cuja existência mais não tem lugar nas sociedades
livres dos tempos atuais;
6. Denunciam, pois, essa nova fonte de arbítrio que surge no cenário institucional,
originária da burocracia estável do Estado brasileiro, principalmente do Estado-juiz,
que não hesita em imolar centenárias conquistas libertárias e garantias fundamentais,
no altar da “conveniência dos serviços” ou da “necessidade da racionalização funcional interna”;
7. Repudiam, com eloquência, a supressão de instâncias e de recursos processuais,
concebidos como garantia inalienável dos cidadãos ao fundamento de que é preciso
imprimir celeridade à tramitação dos feitos ou instituir julgamentos de uma só instância;
Como foi ontem, é hoje e será sempre, os advogados criminalistas do Brasil reafirmam seu
inquebrantável compromisso com a liberdade humana e sua permanente hostilidade a
qualquer forma de autoritarismo, tirania ou desrespeito aos direitos da pessoa, especialmente
daquela que se vê acusada da prática de um delito perante o Estado
.
Curitiba, em setembro, 27, 2013.
Associação Brasileira de Advogados Criminalistas
–
Abracrim
Autor: ABRACRIM